Um hospital, uma fortificação e uma biblioteca
Na minha cidade de nascimento, Badajoz, cidade fronteiriça entre Espanha e Portugal, existe uma biblioteca que guarda muito mais do que livros. A Biblioteca da Extremadura ocupa um antigo hospital militar dentro da alcáçova árabe da cidade — uma fortaleza do século IX. Ao lado, a antiga catedral que já foi mesquita. E no mesmo edifício, a faculdade de “Ciencias de la Documentación y la Comunicación” da Universidade de Extremadura.
Não é só um prédio simbólico. É uma interseção concreta entre história, memória e formação profissional.
A força da rede
A Biblioteca da Extremadura é a cabeça de uma rede que conecta mais de 90 bibliotecas públicas e agências de leitura na comunidade autônoma. Um milhão de pessoas têm acesso a serviços como:
- Empréstimo interbibliotecário gratuito.
- Livros digitais e audiolivros pelo eBiblio Extremadura.
- Filmes, séries e documentários pela eFilm Extremadura.
- Acesso remoto ao repositório digital Ciconia.
Por primeira vez conseguimos acessar e mostrar o trabalho técnico interno de uma biblioteca assim, o controle de autoridades e a catalogação centralizada. Labores fundamentais para garantir um catálogo unificado e coerente — algo essencial, mas quase nunca visto pelo público.
O tesouro de Barcarrota
Entre os muitos fundos raros e preciosos da biblioteca, existe um que beira o mítico: o Tesouro de Barcarrota. Em 1992, ao reformar uma casa, descobriram atrás de uma parede 11 livros e um manuscrito escondidos — todos proibidos pela Inquisição espanhola no século XVI.
Tem de tudo: tratados de quiromancia, um manual de exorcismo, obras filosóficas, um raro exemplar do Lazarillo de Tormes… e até um diálogo erótico entre homens, escrito em tom irônico-filosófico. Em plena Espanha inquisitorial.
Não é apenas um acervo, é um símbolo da resistência intelectual e da censura histórica.
Tecnologia e preservação andam juntas
Com espaço físico limitado e coleções que crescem, a biblioteca prioriza materiais únicos. A digitalização é feita com cuidado, respeitando os direitos autorais e promovendo o acesso aberto sempre que possível. Porque conservar, como eles dizem, também é compartilhar.
Uma luz acesa nos rincões da Extremadura
O vídeo termina com uma imagem bonita: a ideia de que o poder da biblioteca não está em seus muros, mas em acreditar que o saber compartilhado constrói comunidade.
Num tempo em que o autoritarismo avança, o investimento em redes de bibliotecas públicas como essa nos lembra de algo essencial: a cultura não resiste sozinha. É preciso estrutura, profissionais, rede, acesso.
E essa biblioteca, lá no oeste da Espanha, é uma aula viva sobre isso.
O vídeo com legendas em português está disponível no link: